domingo, 2 de outubro de 2011


Aproximo meu rosto do seu e digo baixinho.
- E será que tenho chances ou não faço o seu tipo?
Ela sorri, se fazendo de tímida. Pronto o jogo começou.
- Ai Victor, assim você me deixa sem graça. Disse tentando se desvencilhar dos meus braços.
- É pelo jeito não faço. Disse fazendo cara de decepção e soltando-a.
No mesmo instante ela se emenda.
- Imagina, você um cara lindo, inteligente, talentoso e cheio de mulheres maravilhosas ao seu lado, se interessar por mim.
- E porque não? Você é muito bonita. Talentosa e inteligente, eu tô vendo. Sem ninguém, igual a mim. Ou você tem algum problema de ficar com um vizinho da sua amiga? Começo a sondar o terreno.
- Você tem certeza do que está dizendo? Olha que começo a acreditar viu.
Pronto caiu.
- Então por que não fazemos o seguinte, assim que acabar o show podemos sair daqui para algum lugar, aonde poderemos conversar melhor. Assim quem sabe você não acaba acreditando em mim.
- Um lugar discreto?
- Você escolhe, tá bom?
- Combinado. Assim que tudo terminar aqui eu te procuro. E aí vamos conversar.
Disse toda feliz. Essa foi fácil, até demais.
Chega a nossa vez. O show é perfeito. Tocar em casa é sempre uma alegria. Rostos conhecidos. Platéia empolgada. Já no final interrompemos antes do bis. E agradecemos a presença de todos informando que a coleta de mantimentos tinha sido recorde. Chamamos o prefeito da cidade para subir ao palco, quando isso acontece, ele é ovacionado. Como já disse não gosto de política, não aquelas em que usam o poder para beneficio próprio mas reconheço que o trabalho feito pelo prefeito foi primoroso. Atenção, urgência e dinamismo em tomar medidas administrativas para que a cidade não parasse por completo foram excelentes. O prefeito faz um breve discurso. CHATO! E informa que independente da tragédia o show também tinha uma outra obrigação. A de reconhecer-nos como cidadãos urbelandenses, e ele, na qualidade de prefeito da cidade, nos oferecia então naquele momento a medalha de honra ao mérito por levar a musica sertaneja mineira para todo o Brasil. Nesse momento entram duas jovens, lindas, modelos, cada uma carregando uma caixa, com as medalhas em questão. Recebemos com toda pompa e circunstância que o momento exigia. Ao final da homenagem pedi a palavra, o que normalmente é incomum nos shows, prefiro deixar meu irmão falar, sou tímido.
- Gostaria de agradecer imensamente essa homenagem a todo o povo dessa cidade que acolheu não só a mim como também a minha família com muito afeto. E como o nosso querido prefeito disse. Hoje a noite não foi só uma obrigação para com a tragédia que nos abateu e que de alguma forma nos sensibilizou.
Faço um sinal e entra um dos nossos produtores no palco. Pego um documento de suas mãos agradecendo-o.
- Como fomos acolhidos como filhos dessa terra abençoada nos sentimos na obrigação como cidadãos urbelandenses em também contribuir para a arrecadação. Então excelentíssimo senhor prefeito é com muito orgulho que lhe entrego esse documento em que consta a nota fiscal da compra de material de construção no valor do cachê que receberíamos para que sejam usados na construção de casas para a população desabrigada.
Fomos ovacionados. Imagina. Fizemos por que sentimos que era o nosso dever e não para reconhecimentos. Mas tudo bem, faz parte.

Ainda durante o show M foi para frente do palco, para minha sorte ficou no lado oposto ao meu. Não sei se conseguiria tocar e me concentrar no que estava fazendo se ela estivesse ali na minha frente com aquele almofadinha grudado nela. Em um certo momento percebo que eles estão conversando, conversando não, discutindo. Começo a prestar a atenção nos seus gestos e acabo por me distrair e errar os acordes. Quando me dou conta paro tudo, sou perfeccionista e detesto errar. Meu irmão, sempre ele, aproveitador, não perdoa, começa a me sacanear, brincando que esses momentos são tão raros que quase não se deram conta. Fica me perturbando pois percebe que fico sem graça. Ele relembra que antigamente, quando errávamos, tudo acabava numa bela briga entre irmão, ali na frente do palco mesmo. Eu aproveito a deixa e explico que agora, com tanto tempo de carreira não discutíamos mais na frente do palco mas que o pau comia nos bastidores. Todos rimos e retomamos o show. Tive que me esforçar para não errar mais. Mas não conseguia tirar os olhos do casalzinho.
Terminado o show. Vou para os bastidores. Não teremos visitas ao camarim. Confesso que estranho um pouco. Estava conversando com um dos nossos produtores quando vejo Elaine se aproximar. Sorrio e ela sorri de volta mas não chega mais perto. Discreta. Gostei. Mas não é essa a minha intenção. Quero mesmo é ser visto ao seu lado. Pode até não ser por M mas que chegue aos seus ouvidos... dispenso o produtor e vou em direção a ela.
- E então? Está de pé nossa conversa? Você já está livre?
- Estou sim. Mas... como fazemos?
- Uai! Assim ó.
Pego em sua mão e entrelaço a minha. Despeço-me de todos fazendo questão de desfilar com ela. Ela fica sem ação. Só me acompanhando sem dizer uma só palavra. Incrédula. Para minha sorte esbarramos com M e seu ... seu... bom é melhor deixar para lá. Eles não estavam com cara de bons amigos. A discussão que vi na frente do palco deve ter sido muito forte. Azar o dela mas faço questão de falar.
- Tchau M. Infelizmente hoje não poderei te dar carona. Tô de motorista dessa mocinha aqui ó. Puxo Elaine para meu lado para que elas se vissem. Passo a mão em sua cintura e trago-a para junto a mim. Sorrio. Como é doce a vingança.
M fica completamente atônita. Sem acreditar que a poucos dias tinha conversado com Elaine e que ela lhe aconselhara a investir no Tuca que a cada dia se mostrava mais egoísta e infantil. Como? Como ela fizera isso com ela, sua amiga, bom pelo menos a considerava como tal. Então o cara responde num tom petulante.
- Ela tem namorado, não é necessário se preocupar.
Hum! Se fosse mesmo namorado, na-mo-ra-do. Não a deixava plantada no ponto do ônibus no dia da tempestade e muito menos discutiria em público com ela. Despeço-me deles, melhor dela, dele nem olho na cara. E vou saindo com Elaine a tiracolo.
Vamos até o estacionamento e pego minhas chaves. Abro a porta do carona e convido-a a entrar. Fecho a porta e dou a volta no carro entrando em seguida. Viro-me para ela e pergunto:
- Então. Para onde vamos?

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