sábado, 12 de novembro de 2011


- Já comeu fruta no pé?
- Você quer dizer em pé, né?
Não me contive e dei uma risada.
- Não no pé mesmo. Apontei para o pomar.
- Ah! Tirando direto da árvore. Não.
- Quer comer?
- O que tem?
- Manga, Maça, Laranja ...
M olha para o outro lado e aponta.
- Aquilo ali é bambu?
- Não. Cana.
- Cana? Adoro caldo de cana. Prefiro cana. Pode ser?
- Claro! Você é quem manda.
Viramos nossas montarias e fomos em direção ao pequeno canavial que havia na fazenda. Alguns empregados estavam retirando um pouco de cana. Pedi uma pra nós. Recebi nossa cana e virei novamente o cavalo, agora de frente para M.
- Vamos para a beira do lago. Lá poderemos comer a cana com calma.
M consentiu com a cabeça. Séria. Me entristecia vê-la assim. Mas não tinha como desfazer esse mal estar entre nós. Pelo menos eu não estava conseguindo. Chegamos na beira do lago e apeei. Coloquei a cana encostada numa árvore e prendi meu cavalo num cavalete que tinha por perto. Fui até M que me esperava ainda montada. Segurei as rédeas de seu cavalo. E dei a mão para que se apoiasse ao descer. Ela desce, calada. Amarro seu cavalo, junto ao meu. Pego a nossa cana e vou para a beira do lago, sento em um banco, onde normalmente fico quando resolvo pescar ali. M vem e se senta ao meu lado. Pego meu canivete então começo a cortar a cana em pequenos pedaços e vou separando, ao lado no próprio banco.
- Você tá chateado comigo né! Por causa de ontem a noite.
- Não. Acho que você é que tá.
- Eu tô chateada mas é comigo mesma.
Respiro fundo e recebo um afago nos cabelos.
- Me desculpa?
- Se você me desculpar primeiro!
M balança a cabeça positivamente então ouvimos latidos. Me viro e vejo Irra, minha cadela, pastor alemão. Olho e vejo que ela está agitada, sendo segura pela coleira por Ferreira
- Solta ela Ferreira. Grito.
Ele solta e ela sai correndo, latindo, em nossa direção. Fico em pé, deixando a cana e o canivete no banco. Dou alguns passos e sou recebido com a maior festa. Irra fica em pé sobre duas patas, me lambendo e brincando comigo.
- Ô menina! Desde que cheguei não te dei atenção, né filha! Fazia carinho nela. Vem, cá, vem. Vem conhecer a amiga do pai. Vem. Disse segurando sua coleira e levando-a para conhecer M que era só sorrisos. Ela finalmente voltou a sorrir. Aquele sorriso maravilhoso que só ela tinha. M estica a mão para que Irra sinta seu cheiro, sem medos. Tranqüilamente ela segura Irra pela coleira, puxando-a para junto de si, afagando seus pelos.
- Gosta de cachorro M?
- Amo! Nunca tive um, meus pais não deixavam.
Fico observando M brincar com Irra, impressionante como se davam bem, logo de cara.
- Ela gostou de você. Observei.
- E eu dela. Disse sorrindo novamente. Como é o nome dela?
- Irra.
- Quer cana Irra?
Irra late, feliz. Então M pega um pedaço da cana que tinha cortado e dá na boca da Irra que abocanha e se deita na grama mordendo a cana. Volto a sentar e continuo a cortar a cana então passamos uma manhã tranqüila, conversando, aos poucos o clima pesado foi se dispersando. Graças a Irra que se entusiasmou com a nova “amiga”.
Na hora do almoço deixei M em casa e fui levar Irra para o canil. Almoçamos tranqüilamente e depois sentamos no sofá na sala. Ficamos ali, de forma preguiçosa conversando.
- Victor?
- Oi.
- Que horas vamos amanhã?
- Já quer ir embora? Acabamos de chegar? Brinquei.
M riu. Não era mais a mesma coisa mas era bem melhor do que o clima que estava no café da manhã.
- É que tenho que estar no trabalho no inicio da tarde.
- Bom, nesse caso... saímos pela manhã ainda. Almoçamos na estrada, tudo bem pra você?
- Tá ótimo.
- Quer jogar?
- O que?
- Sei lá, temos um monte de jogos aqui. Peraí.
Sai da sala e fui até o quarto do Mateus, onde estavam guardados vários jogos. Peguei alguns e voltei para a sala.
- Escolhe.
M pegou um por um e ficou vendo.
- Por que não todos?
- Como assim?
- Uma partida de cada. Tipo um duelo. Quem ganhar mais vezes é o vencedor.
- Preparada pra perder? Desafiei.
- Preparado pra apanhar? Rebateu.
Passamos o resto da tarde e o inicio da noite ali, brincando. Por algumas horas esquecemos o mal estar que tinha se instalado entre nós. E nos divertimos a valer. Confesso que algumas vezes deixei M ganhar, mas em outras tentei roubar mas fui flagrado por M que sempre que isso acontecia me batia com as almofadas do chão. Na hora de sempre D. Mirtes vem nos chamar para o jantar, jantamos todos juntos. Eu, M, D. Mirtes e Ferreira. M fez os dois prometerem que assim que tivessem uma folga iriam visitá-la em Uberlândia. Terminou de jantar e pediu licença pois tinha que arrumar suas coisas para a viagem do dia seguinte. Não vi mais M o resto da noite. Na manhã seguinte levantei um pouco tarde, me sentia um pouco triste, afinal nosso passeio estava acabando. Poderia ter sido melhor se não fosse aquela noite. Sacudo a cabeça tentando afastar tais pensamentos. Troco de roupa, separo minha mala que já estava pronta e vou para a sala. Coloco minha mala no sofá da sala, M já está de pé, só que na cozinha, sentada no colo da D. Mirtes ganhando os carinhos da tia.
- Bom Dia! Ihh! Desse jeito essa menina vai é ficar mimada. Disse provocando.
- Quem não gosta de um colo? Pergunta sorrindo.
Seu sorriso estava novamente mais leve. Mas ainda não sinto aquela alegria contagiante de antes.
- Tá certa!
Sento e começo a tomar meu café. D. Mirtes pede licença e se levanta da mesa. M fica ali sentada, já tinha tomado seu café mas ficou ali, me fazendo companhia. Assim que termino pergunto:
- Quer ir embora já?
- Podemos dar uma volta antes? Queria me despedir da Irra.
Concordei. Levantei da mesa e lhe estendi a mão. M me dá a mão e vamos até o canil. Quando me vê, Irra começa a latir e a abanar o rabo. Não tem jeito. Cachorro sempre se denuncia pelo rabo. Abro o canil e Irra sai, fazendo a festa e lambendo M. As duas tinham se entendido, e muito bem por sinal. Ficamos um tempo ali, brincando com Irra. Então olho o relógio.
- É melhor irmos. Senão podemos pegar algum trânsito na estrada e nos atrasarmos.
M concordou com a cabeça. Deu um abraço forte em Irra. Eu a afaguei novamente. Abri a porta do canil e coloquei Irra novamente pra dentro. Voltamos pra casa principal. M pediu licença e foi buscar sua bagagem. D. Mirtes então vem até mim.
- Patrão?
- Fala D. Mirtes.
- Eu separei algumas compotas para M levar, tem algum problema?
- Claro que não D. Mirtes.
M voltou com sua valise que peguei junto com a minha pequena mala.
- Vou colocar isso no carro. Te espero aqui em frente de casa tá? Me despedi de D. Mirtes e do Ferreira, que tinha acabado de entrar na sala.
M ficou ali por mais um tempo. Abraçou os tios emocionada. Voltou a lhes cobrar a visita e recebeu entusiasmada o pequeno farnel que D. Mirtes preparou para ela. Tinham várias compotas, queijo e algumas frutas. Tudo arrumado no maior capricho. Abraçou os tios e foi pra porta da casa me esperar enquanto tirava o carro da garagem. Paro o carro na frente da casa e M abraça novamente os tios, pega sua pequena cesta e entra no carro. Guarda a cesta no chão do banco de trás, coloca seu cinto e acena novamente.
- Vamos?
- É né! Diz meio triste.
Dou a partida, aceno para D. Mirtes e Ferreira. Então, estrada novamente.

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