Eu quis que ela
também fizesse uma foto segurando sua pesca mas M se recusou. Disse que o maior
trabalho quem teve fui eu. Fui então para a beira do rio limpar o peixe.
- Parabéns você
pescou o nosso jantar de hoje.
Falava enquanto
abria o bicho e limpava suas vísceras, limpei tudo, retirei a espinha e as
escamas também, deixando-o pronto para ser assado. Depois de limpo, coloquei o
dourado junto a tilápia na caixa com gelo que levei. Olhei os dois lado a lado
e ri. Era humilhante mas foi uma das mais divertidas pescarias que fiz. M já
estava sentada debaixo da árvore preparando nosso lanche enquanto fui levar a
caixa com os peixes pra charrete. Sentei ao seu lado e começamos a comer.
Riamos e brincávamos sobre a pescaria. M definitivamente era uma ótima
companheira de pescaria. Alegre, divertida e generosa. Cismou que tínhamos que
falar que fui eu que pesquei o dourado, dizia:
- Você acha que
alguém vai acreditar se dissermos que fui eu que peguei o dourado e não o outro
peixinho? Impossível. É melhor assim. Você é um pescador experiente e eu, nossa
fui um total desastre, tive até nojo da isca! Ria com gosto.
- Tá bom. Vou
aceitar sua generosidade mas em troca quem vai fazer o nosso jantar hoje sou
eu. E será dourado assado na folha de bananeira. Decidi.
- Nossa! Me deu até
água na boca agora. Tem certeza? Não ... deixa ... se não ficar bom ainda temos
o macarrão a putanesca que posso fazer rapidinho. Brincou comigo.
Fiz uma careta para
ela. Essa seria a minha singela contribuição para a nossa divertida pescaria.
Depois de um tempo
comendo e brincando M se senta melhor sobre a toalha e me olha séria.
- Victor. Será que
poderíamos ter uma conversa séria agora?
Olhei para M e vi
que não estava mais brincando. Seu olhar era pesado e rigoroso. Me endireitei e
respondi também sério.
- Claro M. Pode
falar, o que está te perturbando?
- Uma estória, muito
difícil para mim. Mas preciso te contar, se estamos nos entendendo tão bem não
é justo esconder isso de você.
Admito que fiquei
curioso mas suas palavras também me deixaram apreensivo. Então ela começou a
falar. Fiquei ali prestando atenção a cada palavra, cada gesto seu.
- Tenho duas
revelações para te fazer mas antes de tudo quero que saiba que não escondi nada
com algum propósito que não fosse o de me preservar. Preservar de tudo e todos.
É a única maneira que aprendi na vida pra me defender. Omitir certas coisas da
minha vida. Só assim não sofro.
Concordei com a
cabeça, pelo visto o assunto era bastante sério. Então ela continuou.
- O primeiro assunto
que quero te contar é sobre a minha família. Ela respira fundo e continua. Bom,
na verdade meus pais não morreram num acidente de carro como te contei quando
estávamos vindo para cá. Na verdade eles estão bem vivos e acredito que muito
felizes com a minha distância deles.
Ela respira fundo
novamente, sinto que está nervosa em falar sobre isso.
- Sou filha de um
casal de posses. Uma das mais tradicionais famílias de BH. Meus pais sempre
sonharam em ter um filho homem. Sabe, pra continuar o nome da família, tocar os
negócios... Minha mãe ficou grávida de mim num período difícil na vida deles,
tanto pessoal como financeiro. Meu pai cobrava de minha mãe um filho, ela tinha
dificuldades para engravidar. Já tinha perdido 3 desde que se casaram. Quando
ela ficou grávida de mim a gravidez foi complicada, de risco sabe. Ela teve que
ficar de repouso absoluto desde o inicio, e naquela época não tinha isso de
saber o sexo do bebê antes do nascimento não. Então quando eu nasci foi uma
grande decepção para eles. Meu pai sonhava com um filho homem para dar
continuidade nos negócios e meu nascimento foi um grande impacto na vida deles.
Eles sequer cogitaram a possibilidade de vir uma menina, como veio. Então...
Vejo que os olhos de
M se enchem de lágrimas. Seguro forte em suas mãos. Pra que se sinta protegida
e incentivada a desabafar. Ela respira fundo e seca uma lágrima que cai em seu
rosto.
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