Eu tinha acabado de receber a péssima notícia da minha
demissão, contenção de despesas, disse meu chefe. Agora eu caminhava pelo
calçadão de Copacabana, perdida em meus pensamentos. Como ajudar nas despesas
de casa? Pai, idoso aposentado, mãe dona de casa e um casal de irmãos
alienados. Há anos o meu salário tinha sido incorporado na renda familiar. Saía
pouco, de preferência para programas gratuitos, ou quase isso. Minha rotina se
resumia basicamente a: de casa para o trabalho e de lá pra faculdade e de volta
pra casa. Não podia me dar ao luxo de grandes diversões, shows, viagens ou
coisas de tipo. A faculdade de comunicação era um sonho acalentado há muito
tempo que finalmente com quase 30 anos consegui realizar. Estudava a noite pois
foi o único período em que ofereciam bolsa de estudo. Uma bolsa de 100% sem a
qual eu simplesmente não conseguiria realizar meu sonho.
Absorta nas minhas preocupações
fui trazida ao mundo real de uma forma bastante agressiva. Um homem, com seus
50 anos (?) me segurara pelos braços e falava coisas desconexas. Um louco,
pensei. Ele me chamava por um nome, Virgínia.
Soltei meus braços e comecei um
diálogo mais insano do que seu ato.
- Me solte seu louco! Vou chamar
a polícia!
- Virginia! Meu Deus! Você está
viva? Como? Você não mudou nada nesses anos todos!
- Que Virgínia o quê! Meu nome é
Carol, não Virgínia.
- Ô meu amor! Disse com tristeza
nos olhos.
Foi seu pai, não foi? Aquele carrasco nazista que te afastou de
mim. Ele me disse que você tinha morrido. Morrido de tristeza. Mas não me
deixou ver seu corpo. Aquele porco ...
- Ei! O repreendi.
Então percebi que ele não estava
sozinho. Junto estava um outro homem, mais ou menos da mesma idade que tentava
acalma-lo.
- Calma Osvaldo! Você está
assustando a moça. Ela não é a Sua Virgínia, não tá vendo!
O tal homem então voltou ao seu
normal. Cruzar com aquela mulher, tão igual a sua doce e amada Virginia reabria
feridas que ele, Osvaldo, lutara ferozmente para apagar do seu passado.
Ele voltou a me olhar. E bem no
fundo deste olhar notei um ar de tristeza, saudades e sofrimento que sem
entender o porque, me identifiquei. O acompanhante desse homem conseguiu
afasta-lo de meu caminho, me dando passagem e se desculpando pelo ocorrido.
Voltei a caminhar, rumo a minha casa, mas o seu olhar triste ficou gravado em
minha memória de um jeito muito marcante.
Cheguei na porta de casa,
respirei fundo e abri. Só ouvi a risada da minha irmã, Samantha, assim que
entrei no quarto arregalei meus olhos. Roupas e mais roupas espalhadas pelas
camas, todas ainda com a etiqueta da loja.
- O que é isso? Indaguei.
- Roupas oras.
- Liquidação? Perguntei já
pensando no valor dessa compra.
- Ai, Carol! Eu lá sou mulher de
comprar roupas em liquidação? Eu hein! Parece que não me conhece.
- Mãe, quanto custou isso?
Seu sorriso pequeno já me deu a
resposta.
- Não torra Carol! Foi com o
dinheiro do meu pai que comprei. Não foi com a sua merreca não tá! Poupe-me dos
seus discursos chatos.
- Discursos chatos? Merreca? Pois
a senhorita fique sabendo que a partir de hoje a coisa vai apertar viu!
Olhando com desdém ela pergunta:
- O que você vai fazer?
Impedir-me de comprar?
Sua última pergunta soou como um
desaforo.
- Fui demitida!
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